quarta-feira, 30 de setembro de 2009


" E assim, baqueio do desejo
ao gozo. E no gozo arfo,
a ansiar pelo desejo. " Goethe

O DESEJO DO TEATRO

O desejo é complexo, tem meandros, mas é, sem dúvida, o que nos põe em movimento. É o motor das conquistas humanas. É nossa vontade ardente, querência, fantasia, aspirações, inspirações e tudo que nos dá a certeza de que o próximo minuto vai valer a pena. Desejo é o que nos tira da cama, nos leva para a cama e nos deixa de cama. Está na raiz das obsessões, depressões, invejas, crimes. Por isso valorizamos alguns, incentivamos outros e tentamos deixar em estado de latência outros, os proibidos. Religião, civilidade, culpa.

Tudo, na existência humana, diria Freud, gira em torno do desejo. Ou do falo, a vara de condão de toda criação, replicaria embriagado de vinho Dionísio!

Se os sonhos são realizações do desejo, assim também é a arte. E a ciência! Não são elasprojeções dos nossos desejos? Cartografias das nossas lacunas, ausências e vazios? Ouso dizer que produzimos artisticamente tantas obras primas quanto seja vital nosso desejo, nosso desejo em desejar, nosso desejo em materializá-las. Mas há que ter desejo de artista!

O teatro nasceu do desejo. Do desejo do homem em ser múltiplo numa só existência. Religião?  Do desejo de celebrar a vida tonto de vinho num ritual fálico. Talvez por isso seja o teatro a linguagem artística que melhor evidencia o desejo de preservação e continuidade da espécie humana. Nasceu do desejo do homem em ser deus através do seu poder de criação. Mas poucos são os artistas. Raríssimos têm disponibilidade de tocar com verdade visceral sua vara mágica. Por isso tão pouca criação. Obra prima. Como deus. Como Téspis.

Quanto maior o desejo pelo teatro, quanto maior a pulsão, a paudurência, maior a entrega do ator ao personagem, condição indispensável à criação de fato ou de falo, à obra prima, única.

Nos textos dramáticos de Plínio Marcos, há a exposição do que há de mais primitivo no desejo humano. Do desejo instintivo reprimido e que apodrece dentro das personagens. Do desejo que tem que se tornar carne e osso como salvação. Há de acontecer a catarse. Barrela.

Atores disponíveis para um desnudamento total e em franco desejo de criar a obra prima estamos em processo de busca, todas às terças-feiras no Centro de Artes Calouste Gulbenkian, pelos personagens de Barrela. Torná-los carne, osso e realidade emocional e social. Estamos em comunhão através desse desejo vital de nos encontrarmos conosco mesmos, com os personagens, com os demais atores, com a demiúrgica criação teatral e, em breve, com o público. Quer comungar conosco? Está convidado, se o seu desejo também pulsa de forma vital pelo teatro.

Barrela e todo esse processo reacendem e ratificam o nosso desejo pelo teatro, pois têm nos possibilitado, não sem certa crueldade, um estado poético só possível com o amor, as drogas ou o crime, para citar Antonin Artaud. E você? Quer esfregar o falo, quer dizer, a lâmpada mágica e ter direito a três desejos?


Pedro Henrique Brandão



Nenhum comentário:

Postar um comentário